segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Não, não temos motivos para ser optimistas...!

"Tenemos motivos de sobra para ser optimistas", assim titula o "El Pais" a propósito do livro "Enlightenment Now. The Case for Reason, Science, Humanism and Progress" de Steven Pinker, apresentado como "uno de los ensayistas estadounidenses más influyentes". Mas se "temos motivos de sobra para ser optimistas", que raio, então, porque não o somos?! A argumentação de Pinker, muito apoiada por Bill Gates, até parece fazer sentido e ser, em si, muito difícil de contrariar. A ler esta prosa apologética, recordo-me de Fernando Pessoa: "Tudo isto faz sentido, o que já não faz sentido é o sentido que isto faz"... A coisa, realmente, só começa a complicar-se quando a confrontamos com a realidade e a interpelamos com a pergunta acima referida. Pinker carreia uma soma de razões para sermos optimistas. Todas de carácter genérico. E, aparentemente, incontestáveis. Os problemas só surgem quando se vai ver como se comporta na realidade cada uma dessas razões. E aí... a coisa deixa de ser cor de rosa para a grande maioria das pessoas. E, assim, se começa a perceber que não é por as pessoas serem estúpidas e ignorarem ou não perceberem os tais "motivos para ser optimistas" que esse optimismo não campeia por aí... É preciso introduzir nesta questão um pouco de teoria da complexidade e usar conceitos como o de assimetria para clarificar a divergência entre o quadro pintado por Pinker, catedrático de Psicologia em Harvard, e a realidade das sociedades ocidentais desta segunda década do século XXI. Homem da área da Psicologia, Pinker dificilmente conhecerá, por exemplo, os trabalhos de George Friedman sobre como a assimetria na distribuição dos ganhos gerados pela globalização da economia tornou essa globalização odiada e execrada por larguíssimos sectores da sociedade americana (e das europeias também). E, ainda por exemplo, já levou Trump à Casa Branca, aos ombros dos "white trash"... Mas ser-lhe-ia útil que os lesse. Igualmente útil lhe seria consultar os textos recentes, com recurso à teoria da complexidade, de Jim Rickards (um consultor de economia da CIA...) sobre a fragilidade intrínseca do actual sistema económico (e o seu possível colapso a curto prazo) gerada pela assimetria no controlo da riqueza. Ou ainda os trabalhos de John Robb, já com alguns anos, que mostram como a crescente assimetria na distribuição do rendimento “matou o sonho americano”... Bill Gates diz que este livro de Pinker é "o melhor que já leu". Não sei que outros livros Gates terá lido. Mas não me custa a perceber que este tenha sido o que mais lhe agradou ler, coisa que ele traduz por "o melhor". Percebo também porque lhe terá agradado tanto... Em resumo, o belo universo que Pinker aqui "vende" está rigorosamente nos antípodas, por exemplo, do "Bienvenue das le pire des mondes ou Le triomph du soft totalitarism" da autoria do "Comité Orwell" francês. Afinal, nem sequer é difícil perceber o entusiasmo transbordante de Bill Gates! 


Tenemos motivos de sobra para ser optimistas

GUILLERMO ALTARES | El Pais | 4 FEB 2018 

Una corriente de pensamiento en alza promueve la fe en el constante avance humano. Steven Pinker ofrece sorprendentes indicadores para medir el progresso

https://elpais.com/cultura/2018/02/02/actualidad/1517595455_554752.html

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