segunda-feira, 7 de maio de 2018

Sines, Chineses, Americanos e… a Fatal Geopolítica

Vai o Governo de António Costa dar aos Chineses o que o Governo de Sá Carneiro/Balsemão/Amaro da Costa recusou aos Americanos…?

Convém não ter “preconceitos de economista” na reflexão sobre Sines e seu contexto marítimo. Muito menos convém imaginar ceder Sines por um “investimento” de 400 milhões… Pensem melhor!

Uma decisão “economicista” sobre Sines (que corresponderia a dar a Pequim o que um governo da AD recusou a Washington…) pode “apenas” conduzir (rapidamente) a uma fatal quebra da unidade nacional do território português.

Eu sei que (lamentavelmente) os nossos economistas não sabem de geopolítica (e muitos até ignoram que isso existe…), apesar dos imensos esforços que o Armando Antunes de Castro fez (de 1978 até 1995) para a introduzir no ISEG. Mas se eles ignoram a geopolítica, ela não os ignorará. O problema é que o País que somos será igualmente cilindrado e irremediavelmente fragmentado…

A geopolítica é muito racional e fria, mas é uma dama fatal! Lembrem-se disso antes de resolver ignorá-la.

Os novos donos de Portugal

Sábado | 05.04.2018 07:00 | por Bruno Faria Lopes

A influência do capital chinês não vai parar de aumentar. Quem já cá está quer comprar mais, há o interesse pela economia do mar e investidores a chegarem a todas as partes do país. Também há riscos – e uma estratégia chinesa para não levantar ondas.

"Estamos de olho neste projecto", diz Guan Qing. Guan é gestora em Portugal do China Development Bank (CDB), o banco público chinês para infraestruturas, financiador em Portugal da EDP e da REN – o projecto de que fala é a expansão do porto de Sines.

Estamos no final de Março, em Lisboa, numa conferência organizada para ajudar a casar duas partes que se cortejam: o governo chinês, interessado na riqueza e no valor geoestratégico da zona económica marítima portuguesa, a maior do mundo; e o governo português, que quer atrair capital para os portos e para a exploração do mar.

Além do CDB, pelo auditório cheio do ISEG passam fundos como o China African Development Bank (com 10 mil milhões de euros) e o China Portuguese Fund (mil milhões), o primeiro que Pequim montou exclusivamente dedicado a mercados de uma só língua, o português. Chi Jianxing, o financeiro que lidera estes dois fundos, seguirá no dia seguinte para o Porto, para uma série de reuniões com empresários portugueses, que por estes dias fazem fila para este tipo de encontro. Na conferência onde os portugueses (incluindo o ministro Augusto Santos Silva) falam em inglês e os chineses em mandarim, o embaixador Cai Run resume o sentimento: da educação ao mar, passando pelas energias, a China está interessada em "todas as frentes".

O interesse chinês em Portugal não pára de aumentar. "O crescimento é de tal forma acelerado que todos os dias aparecem novos investidores", afirma o secretário de Estado para a Internacionalização, Eurico Brilhante Dias. A maior construtora chinesa abriu uma sucursal em Lisboa, várias delegações de províncias chinesas visitaram cidades como Viseu, Peso da Régua e Lisboa, e o município da Guarda assinou um protocolo com a Câmara de Comércio Luso-Chinesa para atrair investimento chinês – e isto foi só em Março, mês em que também foi noticiado que o Estado chinês comprou mais 2% da EDP (tem agora 28,25%), que a Fosun comprou mais 2% do BCP (tem 27%) e que a Luz Saúde completou a compra do grupo de saúde Idealmed por 20 milhões de euros. "Há tanta coisa a acontecer que é difícil mapear", confirma Fernanda Ilhéu, professora e coordenadora do China Logus, um serviço de consultoria dentro do ISEG dedicado à China.

Somando os mais de dois mil milhões de euros aplicados em imobiliário com os vistos gold, o investimento total sobe para cerca de 9 mil milhões, valor que faz de Portugal o segundo país europeu a seguir à Suíça em que o investimento chinês tem maior peso relativo na economia: quase 5% do PIB. Este peso, concentrado em sectores estratégicos, vai continuar a subir. Uma fonte chinesa na comunidade financeira aponta à SÁBADO que o que trava compras maiores neste momento não é tanto o controlo maior exercido por Pequim sobre a fúria aquisitiva de alguns conglomerados – como a Fosun e a HNA, accionista da TAP –, mas a escassez de negócios com dimensão suficiente nos sectores onde os chineses já estão.

Leia mais na edição 727 da SÁBADO nas bancas esta quinta-feira, 5 de Abril, 2018

O poder chinês em Portugal, in Visão, 27.08.2015

Estamos no escuro sobre os novos donos disto tudo

O poder cada vez maior dos investidores chineses em Portugal, públicos e "privados", emana de um contexto interno muito difícil de perscrutar e de antever.

Bruno Faria Lopes | brunolopes@sabado.cofina.pt | 05 de abril de 2018 às 20:13

Na madrugada de 27 de Janeiro deste ano o bilionário chinês Xiao Jian foi raptado no hotel Four Seasons em Hong Kong. A imprensa internacional descreve que foi levado para a China continental por meia dúzia de agentes de segurança chineses numa cadeira de rodas, com um pano a cobrir-lhe cabeça. Sob interrogatório, Xiao terá explicado como movimentou milhões em nome de grandes empresários chineses para contas "offshore". Poucos dias depois, as autoridades chinesas caíram em cima de quatro conglomerados com grande actividade no estrangeiro, incluindo três nomes familiares em Portugal: Fosun, HNA e Anbang.

O Financial Times liga o aperto a estes conglomerados às informações de Xiao. O Presidente Xi Jinping decidiu um aperto a estes grupos que tiram divisas do país a um ritmo fora do controlo de Pequim. Outros jornais ligam o cerco ao HNA, por exemplo, ao facto de ser um dos pilares de apoio de um putativo adversário político do Presidente Xi Jinping. Sejam quais forem as razões, este caso ilustra um dado importante: o poder dos investidores chineses, públicos e "privados", emana de um contexto interno muito difícil de perscrutar e de antever.

A dificuldade em interpretar a China é secular, mas agora que o país é omnipresente em sectores estratégicos portugueses, o problema ganha outra relevância. É difícil escrutinar o risco financeiro destes vastos conglomerados privados, que cresceram meteoricamente e que em alguns casos - como o HNA, dono de 20% da TAP - têm estruturas accionistas opacas. E é ainda mais difícil penetrar nos meandros da força que, no fim do dia, controla todos os agentes económicos chineses: o Partido Comunista Chinês (PCC).

O PCC controla os conglomerados "privados" através da banca pública, do sistema judicial e do aparelho de informação. Nas grandes empresas estatais chinesas, é a SASAC que controla quer os gestores que vêm ao Ocidente dar a cara, quer a estratégia das respectivas empresas - e é o PCC que escolhe quem lidera a SASAC. A sobreposição entre política e economia é profunda e a opacidade é grande, seja para empresários ou para o Estado português, cujos serviços de informação pouco conseguem num Estado como a China.

Para Portugal, isto representa risco e desconforto. Sobre os grandes investimentos estatais chineses na energia (EDP e REN) é o próprio dispositivo português de segurança interna que, em 2016, admitia existir um risco para os interesses económicos nacionais (a referência desapareceu no relatório de 2017). Nos grandes investimentos de "privados" significa conviver com modelos de negócio arriscados e expostos à política - de vez em quando há surpresas como o caso do conglomerado CEFC, que foi intervencionado pelo Estado chinês e que dificilmente comprará a Lusitânia e a Partex. As dificuldades descem ao longo da cadeia alimentar: para os autarcas portugueses, que por estes dias fazem fila para atraírem investimento chinês, é difícil perceber quem está do outro lado (veja-se o exemplo da Wuhan Industries em Oliveira de Azeméis, que a Sábado noticia esta semana).

Há dúvidas sobre se Marco Polo esteve na China e os primeiros relatos fidedignos no Ocidente sobre a China são de portugueses no século XVI, como o soldado Galeote Pereira ou o missionário Gaspar da Cruz. Quase 500 anos depois sabemos muito mais, mas continuamos ainda largamente no escuro sobre as redes de poder e as motivações de quem agora assume uma posição tão relevante na nossa economia. O mesmo já não se pode dizer do grau de conhecimento dos chineses sobre Portugal - o desequilíbrio na relação bilateral não está apenas nos números dos negócios, está na informação. Em Portugal, sem surpresa, só se admite disto em surdina. De resto, é "business as usual".

Jornalista da revista Sábado


A Investida Chinesa... ou Red flag over Portugal (Visão 27.08.2015)

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