Os 69% da abstenção são
um aviso claro de que a actual oferta política não corresponde à procura do
eleitorado.
Em
contraciclo com a tendência europeia, a abstenção voltou a afirmar-se como o
partido mais votado. E com muito mais votos que todos os outros partidos juntos.
Se isto não é uma clara rejeição da oferta política disponibilizada ao
eleitorado pela classe política, é o quê?
Choradinhos
(à posteriori) como o de Paulo Rangel, a apelar aos cidadãos para que pensem
melhor e se disponham a ir votar, ou apelos lancinantes (à priori) como o de
Marcelo mostram bem como os dirigentes políticos pouco ou nada querem entender
do que o eleitorado lhes está a querer dizer: a responsabilidade é vossa!
Há
aqui uma aparente contradição: o sistema partidário mantém-se "firme e
hirto" (ou como diria uma certa alentejana, "coeso nos cascos")
e não parece dar mostras de qualquer dinâmica séria de evolução enquanto apenas
um em cada três eleitores condescendeu em dar-lhe o crédito suficiente para ir
meter o voto na urna. A aparente contradição é, porém, uma disfunção real.
As
"europeias", dir-se-à, são umas eleições menores e, portanto, este
alheamento do eleitorado não é significativo, se o jogo fosse a sério e não a
feijões, o comportamento eleitoral seria outro. Erro. É precisamente por as
"europeias" serem umas eleições menores que o eleitorado pôde e se sentiu à vontade para manifestar o que lhe vai na alma. O dramático apelo de Marcelo, feito de
véspera, caiu em saco roto. O choradinho de Rangel não comoveu ninguém.
A
oferta política disponível (incluindo as mais recentes "inovações"
como o "Chega" ou o "Aliança" de Santana Lopes) claramente
não motivou dois em cada três eleitores. Esqueçam-se as percentagens e olhe-se
para os números absolutos, para os números que nos dizem quantos portugueses votaram em cada partido.
Dos potenciais 10 milhões de eleitores (sim, 10
milhões de eleitores), quantos votaram em cada partido...? Quantos partidos passaram os
500 mil eleitores...? Este exercício desoculta o que se esconde atrás de valores
percentuais de votos expressos e ajuda a saber do que falamos... E, sobretudo,
a visualizar a dimensão da disfunção instalada na nossa democracia e que a está
a fracturar.
Mota Amaral diria que 69 é um "curioso número" mas, aqui e agora, ele sobretudo um "número de aviso"... O eleitorado está pronto para um Salvini ou uma Marine que sejam capazes de o convencer e seduzir.
Sem comentários:
Enviar um comentário