domingo, 23 de janeiro de 2022

Crise Ucraniana: As Ligações Muito Perigosas entre Alemanha e Rússia

Já começa (e vai continuar...) a ficar bem visível “the mess Merkel leaves behind” (https://www.economist.com/leaders/2021/09/25/the-mess-merkel-leaves-behind).

A crise ucraniana (em cujo desencadear a Alemanha teve um papel decisivo), que põe agora a Europa em risco de se tornar um campo de batalha, é apenas um dos 
aspectos dessa herança de Merkel e das pesadas tendências aventureiristas da Alemanha reunificada mas sempre à espera que a NATO lhe resolva os problemas que esse seu aventureirismo cria (vidé Jugoslávia, Ucrânia, etc).


Em paralelo, Berlim desenvolveu, no consulado Merkel, perigosas ligações com Moscovo (https://www.lexpress.fr/actualite/monde/europe/crise-ukrainienne-entre-l-allemagne-et-la-russie-une-liaison-dangereuse_2166566.html). E, também aqui, espera que seja a NATO a resolver os problemas que tais relações perigosas criam.

Depois da reunificação e da passagem da sua capital de Bonna para Berlim, a Alemanha trocou o posicionamento que havia adoptado durante a Guerra Fria, o de uma “Alemanha Europeia”, passando para o de uma “Europa Alemã”. O primeiro grande sinal deste reposicionamento de Berlim foi a destruição da Jugoslávia… "L'Europe est morte à Pristina", escreveu o general francês Jacques Hogard.


Na encarniçada defesa dos seus interesses nacionais, Berlim manteve a sua estratégia geoeconómica (o nacional-mercantilismo servido pelo aparelho teórico do ordo-liberalismo) mas alterou profundamente o seu pensamento e a sua prática da geopolítica. Neste novo quadro, a coerência entre geoeconomia e geopolítica perdeu-se em grande parte.

Exemplo flagrante dessa perda de coerência é o projecto alemão de controlo do mercado europeu da energia, usando o gás russo para criar, na Alemanha, o “hub” europeu da energia. 

A batalha que agora se trava em Bruxelas sobre a definição das energias a apoiar/financiar e as energias a condenar tem tudo que ver com isto. É um momento da guerra pela definição e pela hegemonia no mercado europeu da energia, uma guerra económica que ameaça estilhaçar a União Europeia.

Se a estratégia geoeconómica alemã tem o gás russo como uma das suas bases, é evidente que isso tem consequências geopolíticas. Sendo a segurança (ou seja a estratégia geopolítica) da Alemanha aquilo que é e assentando na garantia da proteção americana, é também evidente que “não bate a bota com a perdigota”.

Este desacerto alemão, desenvolvido por Merkel, manifesta-se agora na coligação que lhe sucedeu na forma de uma orquestra altamente… desafinada. 


Como alguém (https://ecfr.eu/article/sanctions-in-the-pipeline-germanys-troubles-over-russia-and-nord-stream-2/) escrevia há dias:

“Em Dezembro, o chanceler Scholz minimizou o Nord Stream 2 como um mero “projeto do setor privado”, tendo o cuidado de distinguir a operação do oleoduto de quaisquer esforços mais amplos para evitar uma violação das fronteiras ucranianas, descrevendo-os como “questões separadas”. 

Este argumento foi recentemente reiterado pela colega social-democrata de Scholz, a ministra da Defesa Christine Lambrecht, e pelo influente secretário-geral do partido, Kevin Kühnert. 

Em contraste, a ministra das Relações Exteriores alemã Annalena Baerbock e vários outros líderes verdes (e democratas livres) enfatizaram os aspectos geopolíticos do projeto e articularam suas “preocupações com a política de segurança”.

“O resultado foi uma cacofonia de vozes diferentes que deu a impressão de que Berlim não tinha liderança

“Uma nova declaração de Scholz deverá trazer mais coerência ao debate alemão e tranquilizar os parceiros no exterior que começaram a ver a Alemanha como o elo fraco do Ocidente…”


No tabuleiro geopolítico, Merkel desafiou abertamente Putin, quando andou a picar o urso russo, na Ucrânia, sem ter os meios para resolver os problemas sérios que isso poderia criar e que criou. Ao mesmo tempo, no tabuleiro geoeconómico, Merkel negociava com Putin o gasoduto Nord Stream 2, oferecendo-lhe um chorudo negócio e não tendo tampouco neste caso os recursos necessários para evitar ou resolver os problemas de segurança da Alemanha (e da Europa assim totalmente colocada na dependência energética de Moscovo!) que tal gasoduto necessariamente coloca e colocará.

 A União Europeia ainda vai mergulhar no caos de “the mess Merkel leaves behind”…

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