quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Releituras desde início de ano

Meia-dúzia de semanas já passadas neste 2019, é tempo de ver que anda a equipa Intelnomics a reler (as novas leituras ficam para outra altura). Resultados do inquérito e suas (curtas) explicações.


Ninguém no século XX procurou sondar e penetrar os arquétipos da alma portuguesa como António Telmo. O lado invisível desta entidade que é Portugal foi para Telmo uma avenida por onde ele se passeava à descoberta... A realidade simbólica de Portugal tem em Telmo um incansável pesquisador e descobridor. Leitura, portanto, de decisiva importância para alguém que queira ver para além do que está à vista, que queira descobrir os chamados "segredos" e encontrar os arquétipos. 


De "segredos", num outro plano e num outro registo e também com algumas graves lacunas, é outra "releitura" interessante para perceber um fenómeno, de longo alcance, cujo início é coevo do nosso D. Diniz, que nele teve uma acção decisiva. Os autores europeus, regra geral, ignoram ou substimam essa acção do nosso esclarecido rei... Aqui também não escapam a essa regra. Uma razão mais para fazer esta "releitura". Tentar perceber a percepção que estes europeus têm de Portugal e do seu papel e como é que se pode explicar a existência de tais limitações.


Jaime Cortesão é um investigador da história potuguesa a que é necessário regressar periodicamente. Viajante, por gosto mas também muito pela força das circunst âncias, Cortesão viveu em Espanha, em Paris e no Brasil boa parte da sua vida. Talvez, por essa sua peregrinação, é dos primeiríssimos ou mesmoo primeiro dos historiadores portugueses a ter a percepção da fulcrl importância da geopolítica, da geoeconomia e até da "inteligência" (vidé os seus trabalhos sobre a "política do segredo"). Esta edição de que dispomos tem um magnífico prefácio (datado de 1964) do grande mestre Vitorino Magalhães Godinho (outro português parisiense...) que, entre outras magníficas notas, refere a influência do belga Henri Pirenne na bra de Cortesão. Permitimo-nos um acrescento: se Cortesão conheceu o trabalho do pai Pirenne (Henri), é uma imensa pena que não tenha tido a oportunidade de ler o filho Pirenne (o Jacques) cujas "Grandes Correntes" começam a sair em 1943 na Suíça, em plena I Guerra e quando Cortesão já está pelo Brasil.  "Os Factores Democráticos na Fomação de Portugal" fornecem elementos importantíssimos para a construção de uma boa grelha de leitura da história portuguesa.


Da corrente francesa da história económica e social, de cujos alvores Cortesão participou, vem a surgir mais tarde o grande Braudel que fornece um quadro teórico e conceptual que ajuda a compreender Cortesão. Em 1976, Braudel foi convidado pela Universidade John Hopkins para fazer três conferências sobre "material civilization and capitalism". Dessas conferências nasceu a pequena obra "La Dynamique du Capitalisme" que muito mais que coisa que se recomende é de (re)leitura obrigatória. Braudel, por antecipação, acaba aí de vez com a apologética discursata alemã e germanófila e com essa vulgaridade que é o "catecismo" neo-liberal. 

Para além de imprescindíveis, ou seja, necessárias e suficientes,  para acabar com estas vulgatas, as três conferências na John Hopkins são ainda uma muito bem conseguida introdução à grande obra do mestre surgida três anos depois "Civilisation Matérielle, Économie et Capitalisme". Mas, sobretudo, são a destruição (por antecipação) dos pretensos fundamentos teóricos do que viria a ser a vulgata neo-liberal, papagueada por todos os "analistas" de pacotilha que poluem o universo político-mediático. Cortesão, certamente, teria adorado ler estas conferências.


"Brave New War - The next stage of terrorism and the end of globalization", de John Robb, saído há uma boa dúzia de anos, merece uma "releitura" anual para comparar a evolução do "next stage of terrorism and the end of globalization" com o cenário prospectivo avançado por John Robb. E ver como evolui a convergência "next stage of terrorism" e o "end of globalization". Convergência que o John foi o primeiro a estabelecer.


Análise detalhada, minuciosa, impiedosa, organizada e super bem informada (o acumulado de referências é de cortar a respiração) ao "next stage of terrorism" é a do investigador Alexandre del Valle, no seu "La stratégie de l'intimidation". Del Valle procura ir à raíz do terrorismo islamista, desvendar-lhe os arquétipos, mostrar as suas imperiosas lógicas letais e fazer a demonstração de como o Ocidente ainda não conseguiu identificar realmente este inimigo e daí não conseguir enfrentá-lo eficazmente e derrotá-lo. Bem pelo contrário... Lido, pela primeira vez, há dois anos, este "La stratégie de l'intimidation" tem agora uma primeira releitura que está a permitir descobrir uma história do Al-Andalus sobre a qual, na primeira leitura, se tinha passado "como gato sobre brasas" pois o que mais interessava então era a função do mito Al-Andalus na narrativa mobilizadora do jihadismo.
Anos depois de Robb ter publicado "Brave New War" que anunciava "the end of globalization", Jacques Sapir, economista, director de estudos na École d'Hautes Études en Sciences Sociales e prof. na Universidade de Moscovo, publicava "La Démondialisation", onde procura demonstrar que a "globalização", nascida nos anos 70, foi um momento que produziu uma globalização financeira e uma financiarização das economias, teve o seu apogeu mas esgotou-se e está a acabar. Quem está a fazer esta releitura faz notar que não gosta do termo "desmundialização" porque, facilmente ele dá a imagem de que a globalização era (é...) um tricot que agora se "destricota". Uma imagem demasiado simplista e enganadora. E, nesse sentido, falsa. Há realmente uma fragmentação do aparato da globalização mas não há um "destricotar", seria mais profícuo referir a existência de um dinâmico e forte processo de fragmentação. Em curso, obviamente. 


Este retomar dos seus direitos pela história, a política e as nações que a "desglobalização" de Sapir anuncia leva-nos a 1919, a retomar o velho Mackinder e o seu "Democratic Ideals and Reality". E daqui ao "The Tragedy of Great Power Politics" é um pequeno passinho. Passinho para uma tragédia inevitável... É aí que estamos.






segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Os Espiões Estão de Regresso

“O regresso dos espiões” é o tema de capa, desta semana, do influente semanário francês Le Point. A investigação, conduzida pelo sempre atento, bem informado e bem relacionado jornalista Jean Guisnel, é bastante completa e muito actual.

Do ciber à guerra económica e às grandes intrusões ou outras operações de guerra de informação ou de desestabilização de empresas, tudo é abordado.

Também os actores são passados em revista: “Os russos, os chineses, os americanos e nós”, como anuncia a capa.

A investigação parte de uma constatação: “Jamais, depuis la guerre froide, il n'y a eu autant d'affaires d'espionnage. Cybersurveillance, secrets industriels, guerre des satellites…”.



A senhora na foto da capa é a dirigente da Huawey, presa no Canadá, por suspeita de vários crimes económicas mas, sobretudo, tida como uma muito especial agente dos ‘serviços’ chineses. O mundo já não é o do velho James Bond, dos tempos da guerra fria com Moscovo...

E este “regresso dos espiões” é bem o sinal de como está a subir a temperatura da geopolítica e de como vivemos tempos de uma guerra económica intensíssima, mas ainda assim bastante invisível ao comum dos mortais.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

As Novas Caras do Partido Democrata Americano


O Partido Democrata americano está cada vez mais instalado na estratégia política que levou à derrota da sua candidata presidencial, a estratégia de alcançar a maioria pela via da agregação de diferentes e diversas minorias, por vezes, até contraditórias. Este tipo de pensamento político tornou-se hegemónico nas esquerdas ocidentais depois do “desaparecimento” do proletariado e da implosão da União Soviética. Esta substituição das velhas causas sociais da esquerda (que eram a razão da sua existência) por novas causas societais não tem apresentado mais resultados que o divórcio e afastamento do “eleitorado popular” dessa esquerda (hoje, em França, quase 60% dos operários dizem votar Marine Le Pen e apenas 15% apontam o seu voto a J-L Mélenchon... enqunto o PC há muito que dasapareceu reduzido a 2%). Com tais resultados, essa linha política tem sido objecto de críticas (poucas mas arrasadoras). Tal como esta política do PD americano já foi criticada e arrasada por (poucos mas demolidores) autores. No entanto, depois da derrota da Clinton e das recentes vitórias para o Congresso, o PD não tem hoje como fugir dos resultados do que andou a semear desde os tempos de Obama... E vai ter que esperar que o ciclo se esgote. Trump agradece e já arrancou ontem com a campanha eleitoral para 2020.

A China Bateu Dois Records em 2018: O da Alta da Dívida e o da Queda do PIB

China, “o rei vai nu”. Nicolas Perrin, ontem na “Chronique Ágora”, fez a síntese da pouco brilhante (eufemismo...) situação financeira da China e destaca o pântano do “crédito informal” onde se registam situações de regresso à escravatura: as jovens estudantes que não conseguem pagar os seus empréstimos (a que os credores tinham imposto drásticas condições leoninas...) são simplesmente “convidadas” a prostituir-se, indo o dinheiro directo para o bolso dos credores até total reembolso da quantia e dos juros de verdadeira e alta usura. Ou seja, na prática, até que os credores queiram dizer que a dívida está paga. Uma vaga de suicídios já começou a alastrar pelos ‘campus’ universitários chineses...


Chine: nouveau record de dette à la hausse, 
nouveau record de croissance à la baisse

Concernant la Chine, sa dette émise en dollars, après avoir diminué entre 1998 et 2008, a sérieusement progressé à partir de 2015. Cela n'est d'ailleurs pas son unique problème.

Sur les trois premiers trimestres de 2018, l'Empire du Milieu, qui est tout de même la deuxième économie mondiale, a est devenu un "maillon faible" de la chaîne de la dette.


Ratio dette globale/PIB en Chine, par type d'agent économique

Ce graphique de Bloomberg publié fin juillet 2018 fait apparaître le niveau extravagant du PIB chinois alloué au seul paiement des intérêts de la dette (axe de droite).


Pendant que la dette chinoise atteint des plus hauts, voici comment se comporte la croissance du pays:


Cette dette sert à doper les chiffres d'affaires, les bénéfices, les prix des actions, les prix des obligations, l'immobilier...

Cette "folie collective" aboutira "à des situations inhumaines", pour reprendre les mots de Simone Wapler. L'actualité récente montre que c'est d'ailleurs déjà très largement le cas.


Chine: les millenials nantissent leurs prêts [NDLR: non-bancaires] avec des photos de nus

C'est la forme moderne de l'esclavage par la dette qui conduit à gager son corps, comme dans l'Antiquité.


Sintese: A China e os chineses estão muito enleados e enrodilhados nas curvas da dívida (externa e interna) mas o controlo de toda a informação pelo aparelho de Estado do PC Chinês permite-lhes a projecção de uma imagem que está nos antípodas dessa situação real... 



terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Alemanha: Desesperadamente procurando um novo mas improvável “milagre económico”

Com a publicação, hoje, da sua “Industrial Strategy 2030”, Berlim revela as linhas gerais do seu novo Graal. Uma demanda que não vai ser fácil como nota a americana Geopolitical Futures.


In search of the third German economic miracle

GPF Staff  |  Feb. 4, 2019

Germany will publish a new industrial strategy tomorrow named “Industrial Strategy 2030” – mirroring China’s “Made in 2025” and Saudi Arabia’s “Vision 2040.” According to Die Welt, which received an advance copy of the report, the German government aims to boost manufacturing from 23.4 percent to 25 percent of the economy by 2030 in part by providing support for key German companies like Siemens, BMW and Deutsche Bank. The plan also identifies nine strategic sectors ranging from environmentally friendly technology to defense and aerospace equipment that will be the focus of the national strategy. Unlike China and Saudi Arabia, Germany has a track record of conceptualizing and implementing such ambitious plans, but even mighty Germany will face many obstacles before it can achieve these goals. Some of the elements, especially those aimed at boosting German industry, may also set the stage for future disagreements between ...



África: Geopolítica da Cerveja e Guerra Económica

Uma grande caça desenrola-se, em África, no mercado da cerveja. Giuseppe Gagliano estabelece o mapa da geopolítica da cerveja em África e analisa a imparável guerra económica, que aí se desenvolve, pela conquista de posições e pelo controlo deste mercado que, brevemente, representará 37% do mercado mundial da cerveja.



Geopolitica della birra: i grandi produttori a caccia dell’Africa

Di Giuseppe Gagliano | 5 Febbraio 2019
 
Le grandi multinazionali della birra stanno assumendo una posizione offensiva nel continente africano a danno dei produttori locali.

Infatti, secondo Deutsche Bank, il continente africano rappresenterà il 37% del volume mondiale della birra nel 2025.

I grandi giocatori contano sulle dita di una mano. Possiamo menzionare AbInBEV, il principale produttore di birra del continente, l’impero di Castel o il marchio olandese Heineken.

Come abbiamo detto poc’anzi le multinazionali hanno letteralmente spodestato i produttori locali.

Ad esempio la Castel negli anni ’90 ha acquisito il marchio Soboa in Senegal e altre società del Camerun. Una volta acquisite, queste società vengono ristrutturate e fino a un terzo della forza lavoro viene licenziata.

Di recente, Castel ha acquistato cinque birrerie dal colosso danese Carlsberg in Malawi.

In Burundi e in Ruanda, è stata l’olandese Heineken a posizionarsi in modo durevole.

Questa espansione economica non sarebbe possibile senza l’assenso o persino la complicità dei leader presenti in questi Paesi.

Castel, uno dei leader del mercati internazionale della birra nei paesi di lingua francese, era in rapporti con il presidente del Gabon Omar Bongo, morto nel 2009.

La conquista dei mercati esteri non può essere fatta senza una logistica potente, un prodotto redditizio e una buona volontà da parte degli attori locali.

Heineken, ad esempio, ha bloccato con successo l’arrivo del concorrente SABMiller in Nigeria, che improvvisamente ha dovuto affrontare ogni sorta di difficoltà amministrative per quanto riguarda le autorizzazioni essenziali.

Un modus operandi è in evidente contraddizione con la strategia di sponsorizzazione di eventi sportivi e culturali. Inoltre il sostegno che riceve attraverso il suo sostegno all’agricoltura tramite l’Ue e l’Onu non è coerente con le sue importazioni di malto dall’Egitto lontano 5.000 km dal suo birrificio ruandese.

Al contrario, SABMiller (ora ABInBEV) si è impegnata nel 2002 a produrre una birra locale a base di sorgo ugandese. Pertanto, la società è stata in grado di adattare il prezzo del prodotto al potere d’acquisto locale.

Altre iniziative sono state sviluppate con birre di manioca in un birrificio in Mozambico, anche sotto l’impulso di SABMiller.

In “compenso”, le tasse e gli impulsi protezionistici di alcuni Paesi africani per proteggersi dall’esterno sono andati in frantumi. Per non perdere un mercato così ampio come quello africano le multinazionali hanno posto in essere strumenti non ortodossi.

La Heineken ha fatto appello a quasi 2.500 prostitute in Nigeria per convincere i loro clienti che la bevanda dei Paesi Bassi avrebbe dato loro migliori abilità sessuali rispetto alla concorrente Guinness.

Un‘altra modalità di azione attuata dalla Heineken,per contrastare questa volta la concorrente Castel, si è concretizzata nella alleanza siglata con il distributore CFAO in Costa d’Avorio.

Nel continente nero – e non solo – l’esistenza del libero scambio è una pura illusione.

La conquista del mercato africano è stata conseguita – e viene conseguita – attraverso una spietata guerra economica nella quale ogni strumento lecito o meno diventa legittimo, una guerra economica nella quale ad esempio una birra come l’italiana Peroni – che era stata acquisita dalla SABMiller per poi essere rivenduta nell’aprile del 2016 alla giapponese Asti per 2,55 miliardi di euro – ha dimostrato tutta la sua debolezza economica nonostante la sua elevatissima qualità.

Giuseppe Gagliano

https://www.ilprimatonazionale.it/esteri/geopolitica-birra-grandi-produttori-africa-103407/?fbclid=IwAR2O2J5ZodBShlFlfdg6fn8Q4ITXDRqDjE1SBe58FKPckLsquKiKeaY5d1o

Geopolítica e Interesse Nacional: Quem Fala Assim Não É Gago...


“Dobbiamo recuperare senza vergognarcene un concetto semplicissimo: l’interesse nazionale. Siamo europei e alleati degli americani, ma abbiamo un nostro occhio sulla geopolitica“.

Dichiarazione resa dal ministro degli esteri italiano nel 2014


"Precisamos recuperar sem vergonha um conceito muito simples: o interesse nacional. Somos europeus e aliados dos americanos, mas estamos de olho na geopolítica ".

Declaração do ministro italiano dos Negócios Estrangeiros em 2014


PS. A direcção editorial do Intelnomics agradece ao nosso amigo Professor Giuseppe Gagliano a recuperação desta declaração.


A Cortante Lucidez de Kissinger e o Sólido Saber do General MacArthur


segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

Macron: Uma “Aberração Política” no Eliseu



"Aberration politique" é agora a mais corrente definição do presidente francês nas redes sociais do seu país. Macron quis, no seu modo de comunicar, ser eficiente e ter graça mas saiu-se muito mal. E assim se prova também que a saída, no passado dia 3 de Janeiro, do seu fidelíssimo responsável da comunicação não aconteceu por acaso...

“Je suis Gilet jaune" 

Macron recebeu, dia 31 de Janeiro, no palácio do Eliseu, alguns jornalistas por ele escolhidos e convidados e no decorrer da conversa saltou-lhe pela boca a graçola que se tornou viral como disparate:

"Quiconque à une colère est Gilet Jaune. Si être Gilet jaune, c'est vouloir une réduction du nombre de parlementaires, que les Français vivent mieux, un Etat bienveillant, je suis Gilet jaune".

Como se comentou na imprensa francesa, “malheureusement pour Emmanuel Macron, son "Je suis Gilet jaune" n'a pas eu le même impact que le célèbre "Ich bin ein Berliner" de John Fitzgerald Kennedy...

“C'est même tout le contraire à la lecture des réactions des Twittos, nombreux à considérer Emmanuel Macron comme une "aberration politique" et à voir cette phrase comme une "provocation de plus".” 



Conclusão: A comunicação política é um assunto demasiado sério para poder ser deixado nas mãos dos políticos... Ou seja, tal como não se pode deixar os intelectuais brincar com fósforos também não se pode deixar os políticos brincar com a comunicação. 

Macron criou, neste caso, mais uma oportunidade de o aprender, a acrescentar às muitas outras que já tinha engendrado. Se será ou não capaz de aprender alguma coisa é outra questão, sobre a qual os franceses vão ter de decidir.

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Alemanha, o Perigo Maior que Ameaça a Europa


Merkel foi posta na rua pelos seus "amigos e aliados" da CDU e da CSU, o SPD encolhe todos os dias, enquanto os "Verdes" se tornam o segundo maior partido alemão e a direita dura se instala com "armas e bagagens" dentro dos muros do parlamento e espreita a sua oportunidade... Foi você que apontou a Alemanha como modelo ou como referência ("accionista de referência"...) para a Europa? Ora, pense lá melhor...

O sistema partidário alemão implode enquanto no seu solo emergem, como cogumelos depois da chuva, "populismos", uns mais "verdes" e outros mais "castanhos". Mas não é só o sistema político (com Merkel já em fuga) que implode. 

Toda a narrativa corrente sobre a consistência e o dinamismo da Alemanha é uma "storytelling" montada por um eficiente dispositivo de gestão da percepção mas sem qualquer correspondência na realidade.

George Friedman há muito que identificou a Alemanha como uma das economias mais frágeis e vulneráveis pela sua excessiva exposição ao exterior. Uma economia baseada na exportação, como a alemã ou a chinesa, construída por uma estratégia nacional-mercantilista, fica totalmente nas mãos dos seus clientes e à mercê das flutuações que o quadro geopolítico possa sofrer. 

Ora, o quadro geopolítico esteve muito estável até 2008 mas começou, desde então, a produzir terramotos e maremotos, cada vez mais preocupantes e cada vez mais frequentes, e apresentar uma crescente tendência de instabilidade global... Trump é aqui não um causador mas apenas uma consequência.

Jacques Sapir, pelo menos desde 2010, que estuda a estrutura interna da Alemanha, nos seus aspectos sócio-económicos, e considera-a desequilibrada, frágil e em vias de desindustrialização, num "processus de basculement du Made in Germany vers le Made by Germany"... 

Este processo de desindustrialização faz baixar os salários (relativamente e até mesmo em termos absolutos) pelo que, apesar dos bons números apresentados pela Alemanha, os alemães vivem cada vez pior, desde há uma boa dúzia de anos (excepto, claro, os tais do "1%" que aumentam a cada ano a parte da riqueza gerada que acaparam).


No plano financeiro, a situação da Alemanha é realmente catastrófica e constitui a maior ameaça à zona euro. Só a ladainha do "too big to fail" tem valido ao maior banco privado alemão... Já alguém escreveu mesmo que “la Deutsche Bank c’est Lehman Brothers au cube!”

Mantido artificialmente com a cabeça fora de água pelo estado alemão, o Deutsche Bank acumula perdas gigantescas e situações menos claras e mais que duvidosas. Se o mesmo se passasse em Portugal já cá tínhamos uma dúzia de troikas e uns destacamentos da wehrmacht, assessorados por umas brigadas da gestapo...

O segundo maior banco privado alemão, o Commerzbank, igualmente levado ao colo pelo estado alemão, anda desde 2008 pelas ruas da pior amargura e não consegue sair de lá. Como toda a banca privada alemã, de resto! Quanto às caixas regionais têm dois imensos privilégios: estão excluídas da supervisão do BCE e muito bem amparadas e escudadas nos governos dos ‘landers’. Portanto...


Finalmente, na instância política a situação não é melhor. Para além da presente desagregação do sistema partidário, criado logo após a II Guerra, acontece que a fragilidade estrutural do estado alemão é enorme. Há mesmo quem o considere como a mais frágil estrutura política da União Europeia... passível de implosão em tempo curtíssimo.

A narrativa da “storytelling” do sucesso alemão não tem qualquer base de sustentação na realidade. A Alemanha é hoje o maior perigo que ameaça a Europa não pela sua força ou dinamismo mas sim pelas suas fraquezas e vulnerabilidades.



Acabou a ilusão globalista... A geopolítica volta a governar o mundo

Durou 3 décadas o tempo da “globalização feliz”, abriu-se em Berlim e fechou-se em Moscovo. Começou com a queda de um muro e acabou com uma ...