Explica-me
o que é isso da Defesa Nacional, como se eu fosse muito burro
O
termo “defesa nacional” engloba todas as necessidades e o planeamento e preparação
para atender às necessidades essenciais de defesa, industrial e militar
relativas à segurança, bem-estar e economia nacionais, particularmente
resultantes de ações militares ou econômicas estrangeiras.
A
Defesa Nacional visa, portanto, preservar a integridade do território nacional
e a vida das pessoas, bem como defender os interesses vitais dos países e dos
seus aliados. Assim sendo, podemos considerar que a Defesa Nacional é o
conjunto de ações adotadas pelos Estados para garantir a sua sobrevivência
contra riscos e ameaças.
O
objetivo da defesa nacional é, em tempos de paz, preparar o país para uma
possível conflagração. E, se se tratar de um conflito aberto, conduzir a guerra
e alimentá-la, protegendo a população, o solo e os recursos.
O
objetivo da estratégia de segurança nacional é então o de identificar todas as
ameaças e riscos que possam afetar a vida da Nação, em particular no que diz
respeito à proteção da população, à integridade do território e à permanência
das instituições da República, e determinar as respostas que as autoridades
públicas devem fornecer.
Uma
política de defesa nacional coerente é uma das políticas setoriais fundamentais
no setor da segurança. As políticas de defesa devem ser derivadas de políticas
e estratégias de segurança nacional devidamente acordadas. A análise e consulta
das necessidades da política de defesa normalmente resulta no que é
frequentemente chamado de Livro Branco da Defesa que, uma vez aprovado pelos
governos, estabelece diretrizes políticas para o setor da defesa durante o
período da sua vigência.
Tal
como acontece com todas as outras áreas da política, as configurações da
política de defesa devem ser mantidas sob revisão contínua. Inevitavelmente,
com o passar do tempo, as configurações de políticas tornar-se-ão irrelevantes
para o ambiente estratégico, político, econômico, tecnológico ou social, caso
em que uma nova estratégia de desenvolvimento de políticas será provavelmente
necessária. Uma vez que as atividades, estruturas de forças, ou planos de
reequipamento, bem como os orçamentos previstos divirjam significativamente da
política traçada, é provável que seja necessário um reexame das configurações
da política, caso em que o processo precisa ser reiniciado.
Mesmo
depois de implementada, a política ainda precisa ser monitorizada e avaliada
para garantir que atende à intenção política por trás dela.
As
nações que enfrentam uma ameaça comum geralmente reúnem os seus esforços de
defesa em alianças como a OTAN. Embora a OTAN seja uma aliança formal, as
nações também podem cooperar implicitamente em alianças informais,
compartilhando responsabilidades e encargos de defesa sem as amarras de uma
organização internacional.
Função
política soberana, a Defesa é nacional porque diz respeito não só à Defesa Militar
e às Forças Armadas, mas também a todas as administrações responsáveis pelas grandes categorias de funções
ou recursos essenciais à vida do país. E esta é a conceção global que deve ter-se acerca da Defesa. A Defesa
Nacional é, portanto, um dos componentes da política de
segurança nacional, e baseia-se nos seguintes princípios:
•
Globalidade, já que diz respeito a toda a população e a todos os setores da
vida do país (defesa civil, econômica e militar);
• Permanência, porque tem de
ser organizada desde tempos de paz;
• Unidade, para isso sendo
liderada pelo governo;
• Proteção dos interesses
fundamentais do país. Esses interesses poderão ser:
-
Interesses vitais, nomeadamente a manutenção da integridade do território
nacional, o livre exercício da sua soberania e a proteção da sua população e
dos seus nacionais no estrangeiro.
-
Interesses estratégicos, que consistem principalmente na manutenção da paz no
país e nas suas zonas limítrofes, nomeadamente no mar e nos céus, bem como na
preservação das condições necessárias ao prosseguimento das atividades
económicas e de comércio;
-
Interesses de poder vinculados às responsabilidades internacionais do país como
membro de uma aliança de defesa;
•
Contribuir para a estabilidade internacional, pois como membro da comunidade
internacional, os países deverão defender os valores da democracia, bem como a
solidariedade entre os Estados. Portugal tem também responsabilidades especiais
como antiga potência colonial, particularmente em África onde procura favorecer
a emergência de soluções regionais. As responsabilidades internacionais dos
países envolvem sua participação em operações de promoção da paz (peace
keeping e peace enforcement);
•
Trabalhar num quadro europeu, uma visão fundamental para os países europeus, que
devem atuar para a emergência de uma Europa forte, embora preservando as
ligações transatlânticas.
•
Pensar a Defesa como uma conceção global. Essa globalidade tornou-se ainda mais
necessária com a proliferação de armas de destruição em massa (nucleares,
radiológicas, bacteriológicas e químicas), a ascensão do terrorismo
internacional, o desenvolvimento do tráfico (drogas, armas, seres humanos,
falsificação...) e crimes cibernéticos.
De
uma forma geral, uma política de Defesa Nacional estruturada deve poder
proporcionar:
Proteção. Trata-se de garantir
a segurança da população e o funcionamento das instituições e das atividades socioeconômicas
do território. Esta função resulta em particular em:
•
implementação de medidas de segurança das atividades de defesa económica
espalhadas pelo território.
•
ação permanente de segurança das ações de polícia (vigilância, neutralização,
etc.);
• uma
posição marítima e uma posição aérea permanentes (assistência, deteção e
interdição de aeronaves, etc.);
•
Implementação de medidas de segurança dos sistemas de informação;
•
sistemas implementados pelas autoridades civis, em caso de desastres naturais
ou industriais;
Prevenção, Consiste em
antecipar ou reduzir o nível de crises para evitar o uso da força. Baseia-se
em:
•
ação diplomática para uma solução pacífica de conflitos;
• uma política de controlo de armamento;
•
recursos de inteligência estratégica (interceção de satélites de
telecomunicações e observação);
• arranjos de cooperação militar para ajudar os
países com os quais temos acordos de defesa de resolução de conflitos;
• dispor de forças de intervenção rápida.
Projeção
de Força e Poder, caso as medidas preventivas não forem capazes de evitar uma
eclosão militar. O ato pode ocorrer com uma simples presença, ou com o
destacamento de forças beligerantes.
Conhecimento e antecipação, fundamental para
uma ação bem sucedida. Daí a necessidade de dispor de mecanismos eficazes de Inteligência,
a todos os níveis (estratégica, económica, etc.)
Em
suma, a defesa nacional diz respeito a todos os setores do país. Exige uma
organização que cubra não só solo tradicional, mas também dos mares e espaços
aéreos. Tem de constituir uma organização completa, bem estabelecida, de
implementação instantânea, estável e válida tanto no quadro nacional como no
quadro inter-aliado.
Podemos
então olhar para a política de Defesa Nacional em três dimensões analíticas. Em
primeiro lugar, a política militar, que é o conjunto de decisões destinadas a
regular o comportamento político que as Forças Armadas geralmente tendem a
desenvolver. Esta dimensão visa fortemente alcançar o controlo civil.
Em
segundo lugar, a dimensão estratégica que pode ser definida como as ações,
atitudes e medidas estratégicas destinadas a prevenir ou enfrentar diferentes
situações de risco, conflito ou ameaças, potenciais ou reais, que ponham em
perigo os interesses vitais e estratégicos de um país e que exijam a utilização
do Instrumento Militar. Essa dimensão está relacionada à liderança
político-civil da Defesa Nacional.
Em
terceiro lugar, a dimensão internacional, que é aquela que contribui para a
Política Externa e é definida como a política de defesa internacional. Esta
última dimensão é a que deve permitir a articulação entre a Política de Defesa
e a Política Externa, pelo menos de duas maneiras.
Primeiro,
contribui para a Política de Defesa por meio do que os militares chamam de
manobra diplomática.
Em
segundo lugar, a Política de Defesa é essencial para a Política Externa porque
num cenário de incerteza estratégica, onde não está claro quem ou o que é a
ameaça, nem a sua magnitude, nem a sua intenção e direção, ela amortece, embora
não eliminando os riscos de adoção de uma determinada atitude e posicionamento
estratégico. Da mesma forma, a Política de Defesa é essencial para dar
credibilidade à Política Externa.
A
relação entre estas duas vertentes não termina aqui. A Política Externa precede
a Política de Defesa. De facto, seguindo Carl von Clausewitz, consideramos que
a guerra é um fato social, mas fundamentalmente político. Consequentemente,
como argumentou Raymond Aron, a guerra surge da política, determina a sua
intensidade, define o seu motivo e estabelece os seus objetivos políticos. A
guerra termina quando os objetivos políticos são alcançados ou, melhor ainda,
quando a política afirma que os seus objetivos foram alcançados. Os objetivos
da guerra não são militares. Os objetivos estratégicos militares são uma função
dos objetivos políticos. Se não há objetivos políticos não há guerra.
A
Defesa Nacional regulamenta assim a obrigação essencial e indelegável do
Estado, onde devem convergir todos os esforços necessários para a preservação
dos interesses vitais da República. Que tanto o Sistema de Defesa quanto o seu
Instrumento Militar se justificam com base na própria existência do Estado e
não na definição de um determinado cenário temporal e das suas correspondentes
ameaças, e que a sua essência está relacionada ao eventual exercício do
monopólio da força para a resolução do conflito em todos os seus âmbitos, da
crise à guerra ou ao conflito armado internacional, conforme determinado pelo
poder executivo. É então da responsabilidade política estabelecer os parâmetros
e critérios a ter em conta para a missão, organização e funcionamento do
Sistema de Defesa em geral e, em particular, das Forças Armadas para que se
tornem um verdadeiro instrumento de dissuasão, de acordo com a perceção de
ameaças aos interesses da Nação e seus correspondentes riscos presentes e
futuros. Essa dissuasão é uma das formas de atuação e expressão da Defesa
Nacional.
Assim
sendo, a Defesa Nacional é também todo o conjunto de disposições, decisões e
ações que o Estado adota para garantir a sua própria existência e, ao mesmo
tempo, proteger o desenvolvimento do país.
A
Defesa Nacional enfrenta um conjunto de problemas complexos e permanentes em
cuja solução intervêm igualmente os mais altos órgãos de direção política do
Estado, os dirigentes das entidades económicas, sociais, culturais, públicas e
privadas, bem como as Forças Armadas.
Finalmente,
a Defesa Nacional é obrigação de todos os cidadãos, governantes e governados,
bem como estrangeiros residentes no país, sem distinção de raça, credo, partido
político, idade e sexo.
Sérgio Campos
(Presidente do Círculo de Estratégia D. João)